POSSEIRO SEM POSSES
- EM GUETERRA
Imagine só...
Te chamam de posseiro!
Logo você que não tem posse de nada!
Que vive como peregrino a procurar
um
lugar...
Uma terra fixa e fértil,
que dê pra plantar e pra colher,
e aí sim poder sobreviver!
Mas eis que vem eles,
que nem donos cartoriais são,
mas que vem com armas de fogo
e só tens a suas velhas enxadas.
Eles vem pela grilagem,
pelo latifúndio
querendo ser “multifundio”!
querendo ser “multifundio”!
Agora, quando em armas se une aos teus iguais,
vem conflito, começa a ”GUETERRA”,
é a
mais antiga guerra, a pela terra...
Quantos sangues ainda haverão de se
derramar?
Só sei que,
imagina só...
Te chamam de posseiro!
Logo você que não tem posse de nada!
Que vive como um peregrino a procurar
um lugar...
Uma terra fixa e fértil,
que dê pra plantar e pra colher,
Um parêntesis: um conflito de posseiros pouco divulgado e que aqui quero dividir conforme texto colhido na internet...
A REVOLTA DOS POSSEIROS NO SUDOESTE DO PARANÁ EM 1957:
1. Localização e
colonização
Em 1957, o sudoeste paranaense foi palco de intenso conflito pela posse
da terra, envolvendo posseiros, companhias colonizadoras e o poder
público. O conflito teve origem na disputa jurídica pela posse da gleba MISSÕES e
parte da gleba CHOPIM. O governo federal, através da CANGO, implantou na região o projeto de colonização e incentivou gaúchos e catarinenses para
povoá-la.
A companhia colonizadora CITLA, formada por particulares, igualmente
instalou-sena área na condição de herdeira das glebas, resultado de longo processo
judicial envolvendo o poder público e empreendedores particulares. O conflito
pela posse da terra estendeu-se pelos atuais municípios de Capanema, Dois
Vizinhos, Francisco Beltrão, Pato Branco, Pranchita, Santo Antonio do Sudoeste,
Verê e foi concluído com a vitória dos posseiros, que tiveram suas posses
regularizadas e tituladas a partir de 1962.
A região sudoeste do Paraná está localizada ao sul do rio Iguaçu, seu
limite norte separa a do oeste paranaense, ao sul com o Estado de Santa
Catarina, e a leste o município de Clevelândia. É uma região com clima saudável, terras
férteis, rica vegetação, boa hidrografia, que levou milhares de gaúchos, catarinenses
e paranaenses a ali se fixarem nos anos de 1940. Além das condições geográficas favoráveis, que outros fatores teriam
contribuído para a migração de gaúchos e catarinenses à região sudoeste?
É importante destacar que antes de 1940 já habitavam aquela região
índios e caboclos, que adotavam um sistema de produção de subsistência, ainda
não atrelado ao modelo capitalista. Essa produção de subsistência, também chamada de
economia cabocla, baseava-se na exploração de erva-mate, da madeira e na criação
de suínos.
Em geral, parte da historiografia não vislumbra e, em alguns casos, até
omite essa ocupação mais remota da região sudoeste, como se ela tivesse
constituído um imenso vazio demográfico até a ocupação do ser humano branco, civilizado, empreendedor.
É comum ainda verificar-se tal tipo de abordagem, até mesmo para outras
regiões, como o norte e o oeste paranaense. (MOTA, 1999, p. 21 e 22).
De todo modo, o fato é que a região sudoeste do Paraná passou a ser
ocupada“oficialmente” a partir do ano de 1943, com a criação da CANGO (Colônia
Agrícola Nacional General Osório), na vila de Marrecas, atual cidade de
Francisco Beltrão. Este projeto de colonização federal instituído pelo presidente da República
Getúlio Vargas fez parte da política da “marcha para o oeste”, com o propósito de
fixar naquela região agricultores do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, com uma economia
baseada na agricultura familiar de pequena propriedade.
A maior parte destes gaúchos e catarinenses era oriunda de colônias agrícolas formadas por descendentes de alemães e italianos. (ROCHE, 1969, p. 358 e 359). No sobrenome de várias famílias verifica-se esta origem, como será demonstrado mais adiante ao serem citados os principais líderes da revolta.
A maior parte destes gaúchos e catarinenses era oriunda de colônias agrícolas formadas por descendentes de alemães e italianos. (ROCHE, 1969, p. 358 e 359). No sobrenome de várias famílias verifica-se esta origem, como será demonstrado mais adiante ao serem citados os principais líderes da revolta.
Aliás, como está estruturada a propriedade fundiária hoje no sudoeste
do Paraná? E a produção econômica, ainda está fortemente concentrada na
agricultura? Além da colonização oficial dirigida pela CANGO, outros agricultores se estabeleceram de forma espontânea na região.
Uma questão importante e crucial precisa ser referida antes que se fale
da revolta dos posseiros. A CANGO oferecia aos colonos que chegavam à região, em
crescente número, todo tipo de ajuda e assistência: a terra, a casa, ferramentas
e sementes agrícolas, ajuda médica. Tudo de graça, mas sem o título de propriedade
da terra. De modo que, na prática, os agricultores eram posseiros. Tinham a posse da
terra, mas não um documento que atestasse a sua propriedade. E essa situação
constituiria um problema grave mais adiante.
Observando os noticiários de
hoje sobre alguns conflitos agrários, é possível ainda detectar a figura do posseiro? Há lugares em que isso ocorre com mais
intensidade?
2. Histórico das disputas judiciais
As disputas pela posse da terra na região sudoeste do Paraná são do
tempo de Dom Pedro II. Governos e colonizadoras particulares se alternaram
pelo direito de ocupação da área.
Ocorre que a maior parte da região sudoeste fazia parte da gleba
Missões, disputada pela União e o governo paranaense. À época da criação da
CANGO a área estava sub judice, quer dizer, a União e o governo paranaense
disputavam na justiça a posse das terras.
A questão da posse da terra no sudoeste remonta aos tempos do final do Império, quando Dom Pedro II, poucos dias antes de sua queda, concede ao
engenheiro João Teixeira Soares uma área enorme de terras devolutas, em troca da
construção da ferrovia Itararé-Uruguay.
Essa concessão foi mantida na República, com
algumas alterações, mas transferida para o grupo Brazil Railway Company,
responsável pela construção da ferrovia São Paulo-Rio Grande. Esse grupo recebe como
parte do pagamento a gleba Missões, que depois é transferida para a BRAVIACO
(Companhia Brasileira de Viação e Comércio).
Em 1930, o interventor do Paraná
Mário Tourinho anula as concessões dadas à São Paulo-Rio Grande e à BRAVIACO. Em 1940,
o governo federal incorpora ao patrimônio da União a Companhia São
Paulo-Rio Grande e a Brazil Railway Company, o que incluía a gleba Missões. Começou aí a
disputa judicial entre a União e o Estado do Paraná pela gleba Missões. Mesmo
assim, a União instala a CANGO dentro dos limites da gleba Missões.
Resumindo a confusão jurídica: os posseiros do sudoeste do Paraná foraminstalados em áreas de terra que estavam sendo alvo de disputa judicial
entre osgovernos federal e estadual. Juridicamente, a área não tinha dono, mas
estavaincorporada à União.
Para complicar ainda mais a situação, entrou em cena o empresário
catarinense José Rupp, que obteve a penhora de vários bens da Companhia São
Paulo-Rio Grande em troca de uma dívida, entre os quais a gleba Missões e parte da gleba
Chopim, ambas próximas, na região sudoeste.
Como a Companhia fôra incorporada à União, é do governo federal que Rupp tentou cobrar a dívida, o que não consegue e o caso se arrasta na justiça. Em 1950, Rupp vende seus direitos à CITLA (Clevelândia Industrial e Territorial Ltda), de propriedade de Mário Fontana e ligado ao grupo do governador Moysés Lupion. Essa transação constituiu na época um dos maiores “grilos” de terras da história paranaense.
Para se ter uma idéia, a área valia cerca de
300 milhões de cruzeiros e teria sido comprada por algo em torno de 10 milhões. Uma
transação muito suspeita, pois nenhum cartório da região queria registrá-la, o que só
foi possível com a criação de um cartório em Santo Antonio do Sudoeste, igualmente de
forma suspeita.Para se ter uma idéia do tamanho do grilo: a área adquirida pela CITLA
correspondia a cerca de 500 mil hectares, abrangendo grande parte do sudoeste do
Paraná.
Há duas versões em forma de anedota sobre a origem da palavra “grilo”.
Um sertanejo guardava no fundo do baú a escritura, bem escondida. Querendo
mostrá-la a seus amigos, abriu o baú e de lá saltaram, simultaneamente, a escritura
e um grilo (animal). Outra diz que os falsificadores de escrituras se parecem com
os grilos (animais), rápidos, espertos e que fogem rapidamente. (PRIORI, 2000, p.
84 e 85). Será que isso ainda ocorre nos dias atuais?
3. As companhias
colonizadoras
As companhias colonizadoras oficiais e particulares envolvidas na
disputapela posse da área do sudoeste do Paraná: no meio do caminho havia oscolonos.
A CITLA conseguiu a titulação das glebas referidas com escritura
registrada em 1951, mas a União consegue a anulação dessa escritura em 1953, pois a
negociação fora feita de forma ilegal: a Constituição Federal proibia a venda de
terras em faixa de fronteira, sem a devida autorização do Conselho de Segurança Nacional e
exigia que para a concessão de terras públicas, com área superior a 10 mil
hectares, houvesse autorização do Senado Federal. Essas exigências não foram cumpridas
pela CITLA que, mesmo assim, já se instalara na região e iniciara a venda de
lotes.
A revolta dos posseiros tem, então, seu embrião em 1951, quando da
instalação da CITLA na região, agrava-se em 1956, com a entrada de duas outras
colonizadoras ligadas à CITLA, a COMERCIAL (Companhia Comercial e Agrícola Paraná
Ltda) e a APUCARANA (Companhia Imobiliária Apucarana Ltda) e tem seu estopim em
outubro de 1957. É sintomático que a CITLA tenha se instalado na região no
primeiro mandato (1946-1951) do governador Lupion e a COMERCIAL e a APUCARANA no seu
segundo mandato (1956-1961).
Portanto, de 1951, ano em que surgem as primeiras reações ainda
pacíficas dos posseiros, até 1957, ano do levante armado, a questão legal da
propriedade das terras do sudoeste não se definiu, deixando a população em constante estado de
incerteza quanto às suas posses. Ainda mais, a solução definitiva só viria a
ocorrer a partir de 1962, fato que será relatado no final deste trabalho.Aliás, por que a justiça em geral é tão morosa? Será que ela é
imparcial nos seus julgamentos?
QUADRO CRONOLÓGICO DO CONFLITO :
1889 – Durante o Império, D. Pedro II concedeu ao engenheiro João
Teixeira Soares, como pagamento da futura construção da estrada de ferro Itararé-Uruguay, uma
área de terra equivalente a 9 km de cada lado da linha.
1891 – Na República, esta área foi transferida para a Companhia União
Industrial e, posteriormente, para a Companhia de Estrada de Ferro São Paulo Rio
Grande (CEFSPRG) do grupo Brazil Railway Company, que efetivamente construiu a estrada.
1913 – O governo do Paraná titulou parte da gleba Chopim para a
CEFSPRG.
1920 – A CEFSPRG recebeu do governo do Paraná várias glebas já
tituladas, entre elas a gleba Missões, em razão do novo contrato assinado para a construção do
ramal de Guarapuava.
1930 – O governo do Paraná rescindiu o contrato com a construtora
devido à ineficiência na execução das obras do ramal de Guarapuava e iniciou processo de
anulação das escrituras de transferência da gleba Missões, tornando a região sub-judice.
1940 – O governo federal incorporou ao patrimônio da União todos os
bens e as dívidas da construtora Brazil
Railway Company-CEFSPRG. Trava-se uma disputa entre o Estado do Paraná e a União, cada parte dizendo-se detentora do direito de posse
da gleba Missões.
1943 – O presidente Getúlio Vargas, desconsiderando o litígio pela
posse da gleba Missões com o Paraná, instalou na área a CANGO, Colônia Agrícola General
Osório, com o objetivo de colonizar 300 mil hectares na região de fronteira com a Argentina.
1945 – O empresário catarinense José Rupp, considerando-se lesado pela
perda de terras para a CEFSPRG, obteve na justiça a penhora dos bens da empresa, dentre
os quais constavam as glebas Missões e Chopim.
1950 – José Rupp não conseguiu obter a desejada indenização e, em 1950,
vende seus supostos direitos à CITLA, Clevelândia Industrial e Territorial Ltda. A
SEIPN, Superintendência das Empresas Incorporadas ao Patrimônio Nacional, escriturou para a
CITLA a gleba Missões e parte da gleba Chopim.
1951 – A CITLA instala-se no sudoeste do Paraná, com escrtório central
em Francisco Beltrão.
1952 – A procuradoria da República ajuizou contra a CITLA ação de
nulidade da escritura pública de dação para reaver judicialmente as terras. A CITLA recorreu,
ficando a região novamente sub-judice.
1956 – Instalam-se na região mais duas colonizadoras com redivisão da
área de atuação: CITLA na cidade de Francisco Beltrão; a COMERCIAL no interior de
Francisco Beltrão, Verê e Dois Vizinhos; a APUCARANA em Capanema e Santo Antonio do Sudoeste.
1957 – Estoura a Revolta dos Posseiros no sudoesdo Paraná, conflito
entre posseiros e colonizadoras.
1962 a 1973 – O GETSOP, Grupo Executivo para as Terras do Sudoeste do
Paraná, concluiu a obra iniciada pela CANGO e interrompida pela atuação das
companhias. As áreas em litígio são desapropriadas no governo Jânio Quadros, em 1961. Entre 1962 a
1973, o governo federal realizou uma verdadeira reforma agrária no sudoeste, concedendo
cerca de 43 mil títulos de propriedade numa área de 545 mil hectares de terras.
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